Stairway To Heaven.

Subia as escadas em transe, o coração disparado. Quando conseguia pensar em algo, era na visão da SAMU chegando para resgatá-la após sofrer um enfarte. Tinha plena certeza de que seu coração não ia aguentar. A ideia de cair dura na escada não afugentava a felicidade que sentia. Muito pelo contrário, achava poético saber que poderia dar seu último suspiro embalada pelos braços de seu amor (Isso se ele visse que ela caiu ali, talvez ele apenas ficasse esperando sua chegada, em vão, só percebendo que algo havia acontecido quando visse a movimentação dos paramédicos e curiosos em volta).

Ela me confessou, alguns dias depois, que se beliscava enquanto subia, pois acreditava estar sonhando. Afinal, tudo estava acontecendo exatamente do jeito que havia imaginado. A escuridão, a temperatura, o dia da semana, os olhos verdes que se destacavam na penumbra. O sorriso que lhe recebeu (um sorriso que nem ela esperava e que acalentou seu coração atordoado), tudo era absolutamente perfeito.

Aproximou-se lentamente por diferentes razões: primeiro porque não queria chegar perto dele com o coração tão disparado. Segundo porque gravava toda aquela cena em sua cabeça, de modo que pudesse captar cada movimento, cada detalhe. Afinal, sabia que provavelmente nunca mais teria um momento como esse em sua vida. Ou teria?

Conforme se aproximou, ele abriu os braços e puxou seu corpo para junto do dele, com delicadeza, beijando-lhe os lábios. Ela ficou na pontinha dos pés, como bailarina, nunca havia beijado um homem tão alto! Quase teve cãibra na panturrilha, mas permaneceu nessa posição, espremida entre ele e a parede, esquecendo-se completamente da dor e queimação que tomavam-lhe as pernas. Dor alguma a impediria de estar vivendo o que estava vivendo. Tinha convicção que andaria sobre brasas se fosse o único caminho disponível para levá-la para junto dele novamente.

Começou a explorar o amado com as mãos. Explorou primeiro sua barba, depois nos cabelos, sentindo seus dedos se perderem no meio daqueles cachos que a encantaram. Depois desceu as mãos, tocando-lhe o pescoço, os braços, o peito bem definido. Apesar de nunca terem estado juntos antes (e provavelmente nunca mais estarem juntos novamente depois), parecia que já conhecia aquele corpo de outras vidas. Conhecia aquele hálito doce, aquela pele, aquele cabelo. Sabia que, em alguma ocasião da existência, já havia sido envolta por aqueles braços, já tinha se esticado toda para alcançar-lhe a boca. Talvez já tenham sido felizes juntos em outra vida. Imaginou que esse poderia ter sido o motivo pelo qual o amou assim que o viu pela primeira vez. Pensou que Deus, em sua infinita misericórdia, lhe havia dado a chance de reviver, nem que fosse por uma fração de hora, seu amor perdido de uma época distante.

Não estavam tendo um encontro. Estavam tendo um reencontro.

Era uma pena que ele não a tivesse reconhecido dessas outras vidas. Era um desperdício que seus destinos não tivessem se cruzado algumas décadas antes. Numa esquina qualquer da vida. Sobre as luzes de outros holofotes.

Era chegada a hora de partir, conforme haviam previamente combinado. Então ela se foi, sem olhar pra trás. Vivia um paradoxo: estava plena, realizada, feliz. Mas, ao mesmo tempo, partida em milhares de pedaços por dentro. Sabendo que teria que suprimir todo aquele sentimento, sufocá-lo, trancá-lo em algum lugar longe de seu peito.

Foi pra casa e não conseguiu dormir. Escreveu-lhe um e-mail com algumas poucas palavras. Não tão belo quanto os e-mails que haviam trocado antes. A inspiração lhe fugia, asssim como o sono. Enviada a mensagem, foi adormecendo aos poucos, um sono tenso, estremecido pela lembrança de seus lábios de encontro aos dele.

Pela manhã, leu a mensagem que ele havia enviado em resposta. Palavras como "ótimo", "eternizado" e "sublime", se misturavam a outras que ela preferiria nunca ter lido. Mas já esperava por isso, foi o que haviam combinado, não havia o que argumentar.

Engoliu o choro, tatuou a alma de preto e foi viver a vida, que deve prosseguir mesmo com toda dor, pois a dor é, também ela, semeadora de novas oportunidades.

Mas o pior não foi o fim de algo que sequer começou. O pior foi ter chovido à noite. A chuva que ela tanto havia desejado não caiu quando deveria ter caído. Caiu vinte e quatro horas depois. E isso - não a dor que sentia - a fez chorar.

Chorou na chuva, o que era ótimo, pois a chuva se misturava às suas lágrimas e caiam misturadas no chão. Assim, seguindo o ciclo da água, ela teve certeza de que suas lágrimas evaporariam junto com toda aquela água acumulada, subindo aos céus. Pediu às suas lágrimas que entregassem a Deus um pedido, enquanto estivessem no céu, esperando para cair: que Ele, com seu infinito amor, desse a ela a oportunidade - nem que fosse apenas mais uma vez - de ser novamente beijada pelo seu amor impossível, e, que dessa vez, eles finalmente se beijassem na chuva.







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